O General Flores da Cunha, Interventor Federal no Estado, trajando terno castanho, sapatos de pelica inglesa, com polainas brancas, chapeu panamá um pouco à banda e uma belissima gravata grená, desembarcou em Pelotas no dia 12 de maio de 1931, a caminho do Rio de Janeiro e declarou a imprensa: O governo não quer nem pretende locupletar-se à sombra da encampação do Banco Pelotense, se acharem o reerguimento uma tarefa exequivel, estimarei que o transformem em realidade, isso, porem, desde que possam cercar o reerguimento de maximas garantias, para não parecer uma fantasia perigosa. O ambiente em Pelotas era tenso e os acontecimentos sucediam-se em avalanche, estavam decidindo o destino de um estabelecimento criado, mantido e expandido com capital e espirito genuinamente gaucho. O Banco Pelotense era orgulho da fina-flor dos pecuaristas e charqueadores do nosso meridião, da pequena classe media urbana que era acionista minoritaria e dos donos das casas de negócio da colonização ítalo-alemã. Fundado em 5 de fevereiro de 1906 com capital de 3 mil contos de reis, aos 20 anos de existencia, possuia a melhor e maior rede de filiais do sul do Brasil. Mantinha casas no Rio de Janeiro, São Paulo e acabara de adquirir um banco no Espirito Santo. O Sr. Joaquim Luiz Osório,falando na Assembleia Geral que decidiu pela encampação, explicava as causas do desastre: os vicios de origem, a politica expansionista a partir de 1919, o financiamento de empresas, e a mobilização de capital. Na assembleia surgiram duas propostas: a do reerguimento com moratória de 10 anos, apresentada pelo gerente da filial de Novo Hamburgo Sr. João Schmidt, e avaliava o débito do Banco em 33 mil contos de reis, dos quais o Estado do Rio Grande do Sul era credor de 15 mil; da outra era portador o Sr.Francisco Antunes Maciel Jr. representante do Estado que propunha a encampação do Pelotense pelo recem-criado Banco do Rio Grande do Sul, assumindo todos os débitos e a liquidação dos direitos dos acionistas. Em 18.05.1931 o Sr. Francisco Simões Lopes, pede a nomeação de uma comissão para estudar as propostas. Ficou composta dos Srs. Carlos Maximiliano, Bruno Lima, Gonçalo Marinho, Joaquim Luiz Osório, Bertholdo Maia, Augusto Simões Lopes, Alvaro Martins, Octacilio Ribas, Olavo Alves, João Schimidt e Victor Bertucci (que representava os credores da Serra). Essa comissão votou pela encampação , com votos contrários dos Srs. Joaquim Luiz Osório, Betholdo Maia e João Schmidt. No dia seguinte 19.05.1931 a Assembleia Geral dos acionistas decidiu a favor da encampação com 2347 votos que representavam 47904 contos de reis, e a do reerguimento do Banco teve 1,235 votos representando 11700 contos de reis, dignamente defendida pelas familias Assumpção e Osório, em conjunto os maiores acionistas do Banco. Satisfeito, no dia seguinte 26.o5.1931, já em Porto Alegre, analisando a decisão da Assembleia Geral do Pelotense,declarou o Sr Antunes Maciel: Os bancos tem de ser como a mulher de Cesar. Referia-se ao descredito publico em que megulhara ha varios anos e os boatos da quebra e as diversas corridas dos depositantes desde 1926. O trauma social em Pelotas era grande e até hoje os pelotenses purgam a perda de compustura do seu belissimo Banco, a tradição comercial que vinha desde Antonio Gonçalves Chaves com as "Memória Economo-Politicas", e do cerebro economico da Revolução Farroupilha Domingos Jose de Almeida. O Banco Pelotense e a formosa Yolanda Pereira, que havia sido sido eleita a mais bela mulher do Universo eram na epoca o cartão postal da cidade: dai a dor social da classe rica e média que a peneira do tempo ainda não conseguiu discriminar e detectar em todas as suas causas. No polimento dos acontecimentos e da historia economica riograndense, o enxame de politicos que preparou e executou a Revolução de Trinta foi envolvida no episódio. Oswaldo Aranha confessou mais tarde "que o caso do Pelotense foi um cochilo da revolução".A atividade e a organização do Banco foram um bazar permanente, onde se refletiu a realidade economica da area pampiana. Sempre agiu como um braço economico do governo estadual e se mantinha "bajo el ala del sombrero" do todo poderoso e pergaminhado Presidente Dr. A.A.Borges de Medeiros. O Estado sempre manteve grandes depositos no Banco e sua diretoria era amiga e aliada politica do governo. Como o deserto é uma anemia da natureza,o Banco Pelotense sempre representou a pecuaria anemica com subproduto, o charque, de má qualidade com preço e mercado sempre incerto, mas continuava construindo belas sedes nas cidades fronteiriças e mantinha escritorios nas areas coloniais, onde se produzia e operava com lucratividade e pouco luxo. Em determinado momento, a diretoria mandou que se transformassem em promissórias os debitos em conta corrente dos fazendeiros e charqueadores. Decorridos os prazos, face à crise economica acasionada pela primeira Guerra Mundial (1914-1918), o banco tinha a dispor de mais de cem mil reses financiadas a 120 e 150 mil/reis e que estavam valendo 60 ou 70. O colapso foi violento, mas o governo do estado ajudou-o e salvou-o. Os técnicos do Banco agiam como goma elástica de uma sociedade complacente com o pecuarismo, mas de repente secou e se tornou quebradiça. A situação precária era comentada desde o clube dos Caçadores até as porteiras das estancias. Os fazendeiroos que conseguiram liquidar seus débitos no Pelotense assistiam e ouviam os boatos de quebra, rindo, como o fariam ao ver a queda do cavalo da princesa inglesa. O boato era patologico. Na zona colonial, o Pelotense conseguira convencer os colonos a depositarem seus pequenos lucros. Venciam a desconfiança que tinham trazido de suas comunidades européias. O depósito e crédito bancário na região colonial, eram como chita e riscado alguns gostam, outros não. As casas de negocios precederam as capelas como unidades gregárias dos colonos, onde encontravam e discutiam tudo o que acontecia. Geralmente era o comerciante que construia as capelas e nos dias de festas e nos domingos mantinham abertos seus negocios. Nestes pontos originaram novos municipios 20 30 anos depois. Eram tambem paradas de onibus, e logo surgiriam as bodegas onde jogavam cartas e bebiam, principalmente vinho colonial. Entre os colonos haviam grupos mais intelectualizados, que criaram grupos maçonicos e somente quando os capuchinhos vieram da Europa, organizaram estes novos locais e lançaram jornais e contos como "Naneto Pipeta" e outros. Todo o episódio da encampação do Pelotense prende-se a um momento analitico da economia gaucha ligado ao preço do gado e a precaria industria do charque. Sofreu desde o século anterior a concorrencia dos saladeiros do Rio da Prata que comerciavam um produto de qualidade melhor e de menor custo, acrescida ate o ano de 1916 pelo problema da Barra de Rio Grande, que economicamente sempre teve "querer", apesar da famosa frase de efeito de Silveira Martins. Borges em 1917, verificando que o Uruguai exportava desde 1913, mais carne frigorificada que charque. Forçou o Banco Pelotense investir 2 mil contos de reis na Cia. Frigorífica do Rio Grande, que fracassou. Este investimento foi o inicio da entrada no Estado das companhias internacionais. O frigorifico foi vendido ao grupo Westhey Brothers que junto com o Anglo e o Swift, viriam alguns anos mais tarde monopolizar toda a exportação da carne. Lindolfo Collor, editorialista do jornal " A Federação" tentou explicar todo esta alteração que trouxe um grande prejuizo ao Pelotense . Desde então o Banco voava como falena aflita e irrequieta em torno de uma luz o governo estadual. O coronel Alberto Rosa , seu diretor, não deixava de realizar sua viagem anual de férias ao Rio de Janeiro, onde no "vaudeville" carioca passeava e demonstrava a prosperidade do Banco. Faleceu em uma destas viagens e sua sucessão na Diretoria desencadeou uma crise interna que se arrastou até sua encampação. No ano de 1930, em plena efervescencia do preparo da Revolução de 30, desencadeada em outubro, apos a crise de 1929 com os charquedores abarrotados e sem mercado, financiadas pelo Pelotense, o Dr. Pedro Luiz Osório (o médico), viajou até a fazenda Irapuá, onde morava Borges de Medeiros, e pediu ajuda. Mas o presidente do estado era Getulio Vargas. Borges manda um bilhete incisivo mas educado a Vargas, pedindo ajuda ao Pelotense. Os episodios da vida de Vargas de 1915 a 1920 não foram até hoje esclarecidos pelos inúmeros biografos. Foi a epoca, de advogado na fronteira, e casou com uma filha do Sr. Antonio Sarmanho, gerente do Pelotense em são Borja. Num gesto desesperado suicidou-se. Havia anormalidades na escrita do Banco provocadas por um funcionário. E a Diretoria de Pelotas, mandara transformar os débitos existentes em conta corrente fossem transformados em promissórias. Apos o suicidio a familia Vargas retirou seus depositos do Pelotense. O Sr. Alcebiades de Oliveira em carta ao Banco relatou: O dr.Getulio Vargas deu-me noticias de que, não obstante os prejuizos, o ativo cobriria o passivo. Nove anos depois destes episodios, o Dr. Pedro luz Osório venceu a arraia miuda que pululava no Palácio preparando a revolução, e viu Vargas ser visitado pelo Gen.Gil de Almeida, comandante do Exercito, em conversa calma e risonha. O militar foi preso no primeiro dia da revolta. Este comportamento maquiavelico de Getulio e não descrito pelos historiadores. Creio ter sido o fato mais importante do sucesso da Revolução de 30, sentado em seu gabinete neutralizava o comandante do Exercito no sul, embora muitos Osvaldo Aranha e Flores da Cunha, duvidavam do seu comportamento. Mas Vargas seguia os comportamentos de Pinheiro Machado. Ouvi,ouvir...atacar no momento certo. Vargas fundara O Banco do Rio Grande do Sul, em duas salas da Secretaria da Fazenda, e seu diretor era Alcebiades de Oliveira, ultimo diretor do Pelotense. Vargas estava muito bem informado da situação dos problemas em Pelotas, mandou retirar de imediato 45 mil contos de reis da Viação Ferrea e os depositou no novo Banco do Estado. E refutou todos os argumentos do portador do bilhete de Borges de Medeiros. Tudo o que era do Pelotense passou para a Banco do Estado do RGS. Estes fatos demonstram 20 ou 30 anos apos ja eram assimilados por Vargas, simbolizados pela doutrina positivista na execução correta dos orçamentos. O General Flores da Cunha, de volta de sua viagem ao Rio em 1931, apos ler as decisões da Assembleia Geral do Pelotense e as informações de Antunes Maciel, profetizou: "Agora temos um banco que ajudara o desenvolvimento do Estado, mas cuidado: o risco que corre o pau, corre o machado". Estava enfeitado com sua inconfundivel gravata grená.
Nenhum comentário:
Postar um comentário